14 de março de 2015

EU SOU GARI

greve dos garis rio de janeiroEU SOU GARI

Do que eu me lembro, comida era para comer e o resto era para as galinhas. A carne era embrulhada em jornal e o pão vinha num saco de papel.
Hoje as galinhas não precisam mais de comida porque também não são mais as galinhas que eram e a gente nem tem mais quintal e muito menos galinheiro. Além disso, os jornais também estão contaminados e os sacos de papel custam os olhos da cara em lojas de embalagens.
Nada era descartável. Nem a palavra existia. A ordem era guardar. Sempre havia como aproveitar. E é claro que havia oficinas de consertos que consertavam mil vezes o mesmo aparelho.
E então chegou a palavra: descartável. E as embalagens, indestrutíveis.
Fomos inapelavelmente invadidos pelas embalagens em nome da higiene. 
Até para tomar um côco tem que ser na garrafinha de plástico, para gelar. E lá vem o canudo com envelope. E tudo para o mesmo lixo.
Faço compras na feira. Um abacaxi descascado vem envolto num plástico dentro de uma sacola de plástico.
No supermercado: frios em bandejas de isopor cobertos por plásticos. Para doces, dois docinhos só, uma caixa (com tampa, de plástico) Se você quiser comprar uma salada pronta, ela vem até com bandeja (descartável) para comer na cama.
Li recentemente que nos restaurantes, até mesmo os pratos (os talheres já são) terão que receber invólucros de plástico.
Se você resolve comprar um equipamento eletrônico ou eletrodoméstico levará dois séculos para se livrar da caixa de papelão, do isopor, do plástico bolha, da fita colante. Mas você pensa que é só botar na lixeira e tudo está bem. O problema não é mais seu.  
Toda essa sujeira foi inventada para resguardar a sua saúde, amigos. Para livrá-los das bactérias, dos vírus, dos coliformes fecais e outros resíduos – enfrentados diariamente por quem? Pelo gari. Aquele mesmo, que passa correndo, suando, sentindo o cheiro infecto da sua comida, do seu cocô, ouvindo buzinas e desaforos de pessoas que “precisam” chegar em casa para fazer mais lixo.
Onde foi que tudo isso começou? Porque esse deslumbramento com o lixo plástico? Coisa de subdesenvolvidos. A gente vira e mexe e dá sempre nesse lugar-comum. Emergentes, só se conseguirmos romper a camada de plástico e metais que infestam lagoas e mares.
A única coisa certa é que foi tudo uma armadilha.
Os garis estão em greve no Rio de Janeiro. Mas nem por isso as pessoas deixarão de consumir o “seu” iogurte, a “sua” água com gás, “o seu” refrigerante favorito. Brasileiro não junta uma coisa com a outra.
E francamente: Alguém precisa se desfazer da tampa do vaso sanitário, daquela poltrona velha ou do entulho da obra no banheiro justamente quando os garis estão em greve? Isso é sujeira.
A coisa mais importante dos últimos tempos foi a invenção de uma máquina, por um japonês, que converte plástico em petróleo, resolvendo dois problemas de uma só vez.
Muita gente fala até hoje em como o Japão conseguiu recuperar as cidades bombardeadas na guerra. Verdade que recebeu uma montanha de dinheiro. Mas e daí? Não fosse o povo empenhado na ação coletiva, nada teria acontecido.
Mas aqui é o Brasil, um país que cultua o lixo. E esquece o lixeiro.

Um comentário:

  1. Isto que os nipônicos nos deram
    uma aula de civilidade na Copa do Mundo,
    ao fazerem mutirão de limpeza
    no fim de cada jogo que participaram.

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