30 de abril de 2011

ERNESTO SÁBATO (1911-2011)



Foi-se mais um dos grandes escritores do século XX. Aos 99 anos, perto de completar os 100, deixa o mundo em que padeceu de dúvidas e desencantos e escreveu sua grande obra.

Ernesto Sábato nasceu em Rojas, província de Buenos Aires, em 1911. Doutor em física pela Universidade de La Plata, trabalhou no Laboratório Curie, em Paris, e em 1945 abandonou a ciência. Sofreu por isso, porque a ciência ainda muito esperava dele, mas ao entregar-se à literatura teve sua obra reconhecida por Camus e Thomas Mann. Em 1983 foi eleito presidente da Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas, cujo trabalho originou o relatório Nunca más, conhecido como "Informe Sábato". Entre seus ensaios, destacaram-se Nós e o universo, Homens e engrenagens e O escritor e seus fantasmas. Publicou os romances Sobre heróis e tumbas, Abadón, o exterminador e O túnel.

E como é comum acontecer, teve a seu lado uma mulher, Matilde, que o acompanhou, esperou e amparou (ela sim, sem dúvidas que a abatessem) durante toda uma vida de incertezas.


O trecho abaixo é do livro Antes do fim, uma autobiografia triste publicada em 1999, em que fala da morte de Matilde.

"Em seus anos finais, quando a vi abatida pela doença é quando mais profundamente a amei. E penso na valentia com que padeceu minha vida complicada, incerta, contraditória. A seu lado passei momentos de perigo, de amor, de amargura, de pobreza, de desilusões políticas e de tristíssimos distanciamentos, em que ela sempre esperava que o navio sacudido por obscuras tempestades regressasse à calma e eu voltasse a divisar o céu estrelado, esse Cruzeiro do Sul que indicava novamente o rumo, o mesmo que tantas vezes, quando éramos moços, contemplamos sentados em algum banco de praça. E muitos, muitíssimos anos antes, o supremo mistério, recordo-a sussurrando para mim aqueles versos de Manrique:

como se passa a vida

como se achega a morte

tão calando...
...


5 de abril de 2011

O QUE É O CRIME?



» 7 DE MAIO

  • BELO HORIZONTE
    Praça da Estação, 15h30
  • RIO DE JANEIRO
    Jardim de Alah, 14h

  • VITÓRIA
    UFES, 14h

» 8 DE MAIO

  • ATIBAIA
    C. de Conv. Victor Brecheret, 15h

» 15 DE MAIO

  • NITERÓI
    Praia de Icaraí, 14h

» 21 DE MAIO

  • SÃO PAULO
    MASP, 14h

» 22 DE MAIO

  • CURITIBA
    Santo Andrade, 15h
  • JUNDIAÍ
    Estação de Trem, 14h

  • PORTO ALEGRE
    Parque da Redenção, 15h

  • RECIFE
    Recife Antigo - Torre Malakof, 14h

» 27 DE MAIO

  • BRASÍLIA
    Catedral, 14h

» 28 DE MAIO

  • CAMPINAS
    Largo do Rosário, 13h

  • FLORIANÓPOLIS
    Trapiche - Av. Beira Mar, 16h

  • FORTALEZA
    Praça da Bandeira (Dq. de Caxias), 14h

  • NATAL
    Largo do Bar Astral, 14h

  • SALVADOR
    Campo Grande, 14h20

» 25 DE JUNHO

  • RIO DAS OSTRAS
    Concha Acústica/Praça São Pedro

Um ano passado, e eis que a Marcha da Maconha vai acontecer outra vez. Vai acontecer enquanto houver pessoas que se insurjam contra a proibição dos seus direitos individuais. Neste ano o movimento avançou bastante (você pode ver pelo número de cidades em que ela vai acontecer) com a criação do bloco Planta na Mente, que trouxe à cena carioca uma forma bem humorada de lutar pela causa. Também deu os seus passinhos para trás, quando as vaidades entraram em confronto diminuindo o que se deve somar. É da vida.
Você pode dizer que há muitas coisas pelas quais lutar, e achar que isso não tem importância.
Tudo tem importância quando se trata de uma lei da qual se aproveitam corruptos de várias vertentes, impedindo o livro plantio e o livre consumo.
Querem campanha de desarmamento? É necessário antes desarmar os espíritos, proporcionar uma educação que não seja para digitar senhas e baixar a cabeça, alguma coisa que resulte em resgate da dignidade há tanto tempo perdida, quando a escola pública foi desmantelada para dar lugar às escolas caça-níqueis. É com a educação que se criam as consciências para escolher isso ou aquilo. O que temos hoje são lugares muito bem pagos onde se aprendem coisas que ajudam (mas não garantem) as pessoas a acharem um emprego. Educação é outra coisa.
De Realengo, já vimos tudo. A Sra. Leilane Neubarth diz que agora é apagar os sinais e esquecer tudo. Pode? A Sra. Cláudia Costin achou uma solução ótima: vai pintar a escola. O senhor pároco já rezou a missa. Está de alma leve.

E aí, ó, quando tudo parecia meio que andando, com as UPPs instaladas e até mesmo o exército se retirando antes do tempo previsto do Complexo do Alemão, eis que os fora-da-lei surpreendem a todos (principalmente a polícia) com o assalto a uma agência do Bradesco na Rocinha. Nem se deram ao trabalho de se esconder. Foram de cara limpa mesmo, porque afinal, quem é que tem medo de uma política de firulas?
Muito assunto para pouco espaço? É assim mesmo. Tudo parece solto mas está ligado. As famílias de Nova Friburgo, do Bumba, de Teresópolis aguardam até hoje recomeçar a vida. Mas a vida não recomeça nunca. Segue, apenas.
Não se sabe como, mas um cartola da CBF afirma que espera o auxílio de poderes sobrenaturais para construir dentro do prazo o projeto que vai substituir a Granja Grumari como hospedeira da seleção, mais um Museu do Futebol e sei mais o quê.
E assim vai o Brasil: chutando.

E agora me lembro: de Brecht, claro:

"Que é um assalto a um banco diante de um banco?"







1 de abril de 2011

O DIA DA RAÇA


A guerra é a coisa mais abominável que há. Dizendo assim, parece ser uma frase do senso comum. Não é. Poucas pessoas acham que a guerra é abominável. Dizem que acham, mas mentem. Os que mandam, por exemplo, em toda a sua hierarquia, não acham. Tanto é que ordenam. E os que lutam também não, caso contrário não lutariam.

Se eu não lutar sofrerei represálias, diz o jovem candidato a soldado. E daí? Oferecer-se para morrer na juventude não é pior que sofrer qualquer represália?

Mães recebendo os corpos dos filhos, homenagens, medalhas, salvas de tiros. Grande merda! Já lá se foi o filho. O que fazer com essas bobagens?

Malgrado isso (legal, malgrado isso, quase nunca uso) as guerras continuam. E seguem com agravantes que são os estupros de sempre, os assassinatos por hora, os incestos socialmente aceitos e os avanços dos malucos em geral. Não se preocupem homossexuais e negros. Os ataques às mulheres cobrem muito bem os das outras duas categorias (?), segmento, vá lá.

Felizmente acabou o famigerado "mês da mulher", substituindo o Dia Internacional da Mulher.

As mulheres se homenageiam, aceitam homenagens, relembram a trajetória das que morreram vítimas por ousarem se insurgir. Mulheres e insurreição não são muito bem vistas na sociedade dos homens.

Para isso existe a repressão. E falando em repressão, eis que a polícia ocupa parte substancial do noticiário em que ela, isso mesmo, ela, é a criminosa. Francamente? Que coisa, hem?

Essa polícia é que botaram lá nas favelas pra se "integrar" com a comunidade? Deus do céu. Chama o ladrão!

Aos inocentes que acharam que as UPPs eram sinais de uma mudança de comportamento na polícia, devo dizer: pra que tanta ilusão?

A polícia tem cada vez mais fome. É o bicho solto. E com muita fome. Ando de um lado para outro, com o peito arfando de raiva e de fome (a raiva que a fome dá) e ruge, e caminha e ruge. Ao menor vacilo, do carcereiro ou da borboleta, ele se atirará sem pensar. Mas um leão é um leão. É um rei aprisionado. E um policial... bem, um policial é o que chamaríamos de ... de quê mesmo? Enfim, um policial é outra coisa.

A delegada Martha Rocha é pessoa muito corajosa, para enfrentar o dia-a-dia sinistro. Mas só enfrenta porque não vai além do que a deixam ir. Se alguém precisa de uma investigação solene para interpretar o fato de um policial ter jogado, sem motivo, spray de pimenta no olho de um homem que assistia a uma discussão sobre o pagamento de um aluguel prometido, isso é hesitar. Hesitou, perdeu.

Se a delegada acha que é preciso intaurar uma investigação para constatar o que mostra uma imagem tão nítida, tão absurdamente explosiva, então ela está fazendo o que a corporação quer que faça: que espere, que esprema, que evite que a situação se altere.

Eis os fatos, amigos: a mulher avança até onde pode avançar, se quiser avançar mais terá as pernas cortadas.

E frente a essa constatação nos despedimos do famigerado dia das mulheres (e este ano ainda se estendeu por todo o mês), quando as mulheres recebem agrados do sistema para que o seu "lado maternal" se enterneça e ela não vá até onde deve ir.

O recado às mulheres é: se você se rebelar e morrer, tudo bem, você será uma heroína. Mas se você se rebelar durante muito tempo e pior ainda, se tiver seguidoras, saiba que vamos destruir você.
E essa deve ser a primeira guerra a acabar.

Por oportuno, vai aqui o poema


O DIA DA RAÇA

(Ed. O Mirante - Portugal)


de José Niza

(Angola)




Todos os povos têm uma pátria

excepto os que andam a lutar por ela

e todas as pátrias têm o seu dia

e decretou um decreto que seria

O Dia de Camões Dia da Raça

e que o povo se juntasse

numa praça



no Terreiro do Paço

na tribuna

à sombra

estão sentados

O Governo o Cardeal

Generais a granel poucos Almirantes

e algumas catatuas bem falantes

de chapéus e leques

tudo como dantes

em salamaleques


mais abaixo

no asfalto

ao sol

formam os heróis

coxos e manetas

em cadeiras de rodas

ou de muletas

estropiados

mas condecorados.



muitos não estão lá

estão nos cemitérios

mas vão os filhos

receber os prêmios,

ou os pais

vestidos de naftalina

ou as viúvas

de negro vestidas

todos a oferecerem

suas dores sentidas

ao grande espectáculo dos demais


não bastou apenas que morressem

a Pátria ainda quer mais


...