30 de novembro de 2009

LEGALIZAÇÃO EM MARCHA



Atenção, estamos vivendo um momento importante, daqueles que compõem o histórico de uma causa em marcha.
Depois de avanços curtos frente às críticas diversas, eis que o movimento pela legalização do uso e plantio da maconha avança. Não basta, já se sabe. Mas já é um início. A abolição completa da proibição do uso de drogas há de chegar, porque os tempos são outros, o crack campeia livre, a polícia diz que está sendo treinada mas maus hábitos são difíceis de extirpar.
Além disso, todo o mundo sabe e não adianta fingir, a repressão está ligada ao extermínio gradual dos mais pobres, em sua maioria negra, que superlotam as cadeias em condições subumanas. Isso quando a lei pune com a privação da liberdade, mas não com a perda da dignidade.
Quantos estão nas cadeias ligados a delitos por pequeno porte e consumo, ou mesmo pequeno comércio, digamos assim. Se legalizada a atividade, seriam apenas etapas da cadeia produtiva? Uma hipocrisia, tudo isso, que é assim que se mantêm os déspotas e suas entourages. Aliás, Arruda (de novo?). Era líder de FHC, agora é o próprio dem.
Mas tudo tem um fio. O tempo passou, FHC é a favor da legalização. No próprio governo não foi, mais eis que vislumbra um potencial e já prepara a bocarra. Será possível que trague?
Tudo bem, é preciso suportar a má convivência, se a causa progride. Já se passou o tempo em que a gente não sentava à mesma mesa com um desafeto político.
Outro parceiro, vocês sabem, é o próprio jornal O Globo que inaugurou as palestras no Auditório Irineu Marinho, em agosto, e mantém um ótimo blog que ultimamente ficou ainda melhor com a participação dos leitores, dentre os quais estão o antropólogo Sérgio Vidal, à frente da Marcha da Maconha, em Salvador, e do sociólogo Renato Cinco, à frente do Coletivo pela legalização do Rio de Janeiro, além de outros leitores também muito bem posicionados e que ainda escrevem bem. São freqüentes os gringos, o que sempre é um suporte confiável, não é mesmo companheiros?

Bom, o que quero dizer é que estou indo para Salvador para participar da Marcha da Maconha. Quero ver como o povo se organiza lá, vou levando meu baseado em quê - um fininho que satisfaz, como cunhou Cristina Silveira. Volto dia 8, quando estará acontecendo outro encontro desta vez na Oi Futuro (o que se há de fazer?) do Flamengo, às 19h, ao qual estará presente Sérgio Vidal, que também é representante da UNE no Conad - Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas. Ele é muito bom.
Estou chamando os adeptos. Espero estar presente, porque volto também dia 8. Sempre fui adepta das causas abolicionistas. É uma boa coisa de se fazer na vida.
E sabem de uma coisa? Eu nem me importava de chegar e não ter lugar. Eu ia ficar feliz de saber que o auditório ou o que for estará cheio, e no próximo haverá ainda mais gente e no futuro (no futuro mesmo, não no oi) a liberdade será para todos.


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17 de novembro de 2009

MANUEL ANTONIO DE ALMEIDA - 178 ANOS


Do jeito que inventei de homenagear meus santos, não vai haver um santo dia em que não tenha que escrever. Que maravilha que tenhamos a festejar tantos e tão grandes escritores. Lembro do encanto que me trouxe a leitura das Memórias de um Sargento de Milícias. A realidade urbana, e pobre, acontecendo nos livros. E o estilo. Sempre gostei de estilo. Manuel Antonio de Almeida foi uma revelação. E ainda hoje é um prazer.
Portanto, graças à Internet, compartilho com vocês essa prosa pra lá de boa. Só um pouquinho né, porque bom mesmo é livro.

Memórias de um Sargento de Milícias.
I ORIGEM, NASCIMENTO E BATISMO

Era no tempo do rei. Uma das quatro esquinas que formam as ruas do Ouvidor e da Quitanda, cortando-se mutuamente, chamava-se nesse tempo -- O canto dos meirinhos -- ; e bem lhe assentava o nome, porque era aí o lugar de encontro favorito de todos os indivíduos dessa classe (que gozava então de não pequena consideração). Os meirinhos de hoje não são mais do que a sombra caricata dos meirinhos do tempo do rei; esses eram gente temível e temida, respeitável e respeitada; formavam um dos extremos da formidável cadeia judiciária que envolvia todo o Rio de Janeiro no tempo em que a demanda era entre nós um elemento de vida: o extremo oposto eram os desembargadores. Ora, os extremos se tocam, e estes, tocando-se, fechavam o círculo dentro do qual se passavam os terríveis combates das citações, provarás, razões principais e finais, e todos esses trejeitos judiciais que se chamava o processo. Daí sua influência moral. Mas tinham ainda outra influência, que é justamente a que falta aos de hoje: era a influência que derivava de suas condições físicas. Os meirinhos de hoje são homens como quaisquer outros; nada têm de imponentes, nem no seu semblante nem no seu trajar, confundem-se com qualquer procurador, escrevente de cartório ou contínuo de repartição. Os meirinhos desse belo tempo não, não se confundiam com ninguém; eram originais, eram tipos, nos seus semblantes transluzia um certo ar de majestade forense, seus olhares calculados e sagazes significavam chicana. Trajavam sisuda casaca preta, calção e meias da mesma cor, sapato afivelado, ao lado esquerdo aristocrático espadim, e na ilharga direita penduravam um círculo branco, cuja significação ignoramos, e coroavam tudo isto por um grave chapéu armado. Colocado sob a importância vantajosa destas condições, o meirinho usava e abusava de sua posição. Era terrível quando, ao voltar uma esquina ou ao sair de manhã de sua casa, o cidadão esbarrava com uma daquelas solenes figuras que, desdobrando junto dele uma folha de papel, começava a lê-la em tom confidencial! Por mais que se fizesse não havia remédio em tais circunstâncias senão deixar escapar dos lábios o terrível -- Dou-me por citado. -- Ninguém sabe que significação fatalíssima e cruel tinham estas poucas palavras! eram uma sentença de peregrinação eterna que se pronunciava contra si mesmo; queriam dizer que se começava uma longa e afadigosa viagem, cujo termo bem distante era a caixa da Relação, e durante a qual se tinha de pagar importe de passagem em um sem-número de pontos; o advogado, o procurador, o inquiridor, o escrivão, o juiz, inexoráveis Carontes, estavam à porta de mão estendida, e ninguém passava sem que lhes tivesse deixado, não um óbolo, porém todo o conteúdo de suas algibeiras, e até a última parcela de sua paciência, Mas voltemos à esquina. Quem passasse por aí em qualquer dia útil dessa abençoada época veria sentado em assentos baixos, então usados, de couro, e que se denominavam -- cadeiras de campanha -- um grupo mais ou menos numeroso dessa nobre gente conversando pacificamente em tudo sobre que era lícito conversar: na vida dos fidalgos, nas notícias do Reino e nas astúcias policiais do Vidigal. Entre os termos que formavam essa equação meirinhal pregada na esquina havia uma quantidade constante, era o Leonardo-Pataca. Chamavam assim a uma rotunda e gordíssima personagem de cabelos brancos e carão avermelhado, que era o decano da corporação, o mais antigo dos meirinhos que viviam nesse tempo. A velhice tinha-o tornado moleirão e pachorrento; com sua vagareza atrasava o negócio das partes; não o procuravam; e por isso jamais saía da esquina; passava ali os dias sentado na sua cadeira, com as pernas estendidas e o queixo apoiado sobre uma grossa bengala, que depois dos cinqüenta era a sua infalível companhia. Do hábito que tinha de queixar-se a todo o instante de que só pagassem por sua citação a módica quantia de 320 réis, lhe viera o apelido que juntavam ao seu nome. Sua história tem pouca coisa de notável. Fora Leonardo algibebe em Lisboa, sua pátria; aborrecera-se porém do negócio, e viera ao Brasil. Aqui chegando, não se sabe por proteção de quem, alcançou o emprego de que o vemos empossado, e que exercia, como dissemos, desde tempos remotos. Mas viera com ele no mesmo navio, não sei fazer o quê, uma certa Maria da hortaliça, quitandeira das praças de Lisboa, saloia rechonchuda e bonitota. O Leonardo, fazendo-se-lhe justiça, não era nesse tempo de sua mocidade mal apessoado, e sobretudo era maganão. Ao sair do Tejo, estando a Maria encostada à borda do navio, o Leonardo fingiu que passava distraído por junto dela, e com o ferrado sapatão assentou-lhe uma valente pisadela no pé direito. A Maria, como se já esperasse por aquilo, sorriu-se como envergonhada do gracejo, e deu-lhe também em ar de disfarce um tremendo beliscão nas costas da mão esquerda. Era isto uma declaração em forma, segundo os usos da terra: levaram o resto do dia de namoro cerrado; ao anoitecer passou-se a mesma cena de pisadela e beliscão, com a diferença de serem desta vez um pouco mais fortes; e no dia seguinte estavam os dois amantes tão extremosos e familiares, que pareciam sê-lo de muitos anos. Quando saltaram em terra começou a Maria a sentir certos enojos: foram os dois morar juntos: e daí a um mês manifestaram-se claramente os efeitos da pisadela e do beliscão; sete meses depois teve a Maria um filho, formidável menino de quase três palmos de comprido, gordo e vermelho, cabeludo, esperneador e chorão; o qual, logo depois que nasceu, mamou duas horas seguidas sem largar o peito. E este nascimento é certamente de tudo o que temos dito o que mais nos interessa, porque o menino de quem falamos é o herói desta história. Chegou o dia de batizar-se o rapaz: foi madrinha a parteira; sobre o padrinho houve suas dúvidas: o Leonardo queria que fosse o Sr. juiz; porém teve de ceder a instâncias da Maria e da comadre, que queriam que fosse o barbeiro de defronte, que afinal foi adotado. Já se sabe que houve nesse dia função: os convidados do dono da casa, que eram todos dalém-mar, cantavam ao desafio, segundo seus costumes; os convidados da comadre, que eram todos da terra, dançavam o fado. O compadre trouxe a rabeca, que é, como se sabe, o instrumento favorito da gente do ofício. A princípio o Leonardo quis que a festa tivesse ares aristocráticos, e propôs que se dançasse o minuete da corte. Foi aceita a idéia, ainda que houvesse dificuldade em encontrarem-se pares. Afinal levantaram-se uma gorda e baixa matrona, mulher de um convidado; uma companheira desta, cuja figura era a mais completa antítese da sua; um colega do Leonardo, miudinho, pequenino, e com fumaças de gaiato, e o sacristão da Sé, sujeito alto, magro e com pretensões de elegante. O compadre foi quem tocou o minuete na rabeca; e o afilhadinho, deitado no colo da Maria, acompanhava cada arcada com um guincho e um esperneio. Isto fez com que o compadre perdesse muitas vezes o compasso, e fosse obrigado a recomeçar outras tantas. Depois do minuete foi desaparecendo a cerimônia, e a brincadeira aferventou, como se dizia naquele tempo. Chegaram uns rapazes de viola e machete: o Leonardo, instado pelas senhoras, decidiu-se a romper a parte lírica do divertimento. Sentou-se num tamborete, em um lugar isolado da sala, e tomou uma viola. Fazia um belo efeito cômico vê-lo, em trajes do oficio, de casaca, calção e espadim, acompanhando com um monótono zum-zum nas cordas do instrumento o garganteado de uma modinha pátria. Foi nas saudades da terra natal que ele achou inspiração para o seu canto, e isto era natural a um bom português, que o era ele. A modinha era assim: Quando estava em minha terra, Acompanhado ou sozinho, Cantava de noite e de dia Ao pé dum copo de vinho! Foi executada com atenção e aplaudida com entusiasmo; somente quem não pareceu dar-lhe todo o apreço foi o pequeno, que obsequiou o pai como obsequiara ao padrinho, marcando-lhe o compasso a guinchos e esperneios. À Maria avermelharam-se-lhe os olhos, e suspirou. O canto do Leonardo foi o derradeiro toque de rebate para esquentar-se a brincadeira, foi o adeus às cerimônias. Tudo daí em diante foi burburinho, que depressa passou à gritaria, e ainda mais depressa à algazarra, e não foi ainda mais adiante porque de vez em quando viam-se passar através das rótulas da porta e janelas umas certas figuras que denunciavam que o Vidigal andava perto. A festa acabou tarde; a madrinha foi a última que saiu, deitando a bênção ao afilhado e pondo-lhe no cimeiro um raminho de arruda.

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15 de novembro de 2009

JORGE DE LIMA


clique para ouvir Tarde oculta no tempo



Poesia, vocês sabem, é a minha religião. Hoje, portanto, deveria ser feriado nacional.
Feriado nacional pelo nascimento de Jorge de Lima, alto destaque de frente da poesia brasileira. E fosse assim, seríamos um país de feriados porque graças à fé dos poetas eles não param de se multiplicar. Se são grandes como Castro Alves, ou obscuros como eu, não importa. Todos cultuamos nossas devoções. Para qualquer coisa, estão ali, à mão, quando precisamos. É só esticar o braço, dar uma rodadinha com a cadeira, quem sabe, e eles chegam para organizar nosso pensamento, expressar o nosso sentimento, acender nosso espírito tão desejoso de luzes. Tudo isso com o domínio absoluto da letra.
Amém, amemos, amem Jorge de Lima os velhos amantes, encantem-se os novos leitores com a alta Graça do Poeta. E decretemos: hoje é feriado nacional.





ADEUS POESIA


Senhor Jesus, o século está podre.
Onde é que vou buscar poesia?
Devo despir-me de todos os mantos,
os belos mantos que o mundo me deu.
Devo despir o manto da poesia.
Devo despir o manto mais puro.
Senhor Jesus, o século está doente,
o século está rico, o século está gordo.
Devo despir-me do que é belo,
devo despir-me da poesia.
devo despir-me do manto mais puro
que o tempo me deu, que a vida me dá.
Quero leveza no vosso caminho.
Até o que é belo me pesa nos ombros,
até a poesia acima do mundo,
acima do tempo, acima da vida,
me esmaga na terra, me prende nas coisas.
Eu quero uma voz mais forte que o poema,
mais forte que o inferno, mais dura que a morte:
eu quero uma força mais perto de Vós.
Eu quero despir-me da voz e dos olhos,
dos outros sentidos, das outras prisões,
não posso Senhor: o tempo está doente.
Os gritos da terra, dos homens sofrendo
me prendem, me puxam - me dai Vossa mão.



Poema do nadador

A água é falsa, a água é boa.
Nada, nadador!
A água é mansa, a água é doida,
aqui é fria, ali é morna,
a água é fêmea.
Nada, nadador!
A água te lambe, a água te abraça
a água te leva, a água te mata.
Nada, nadador!
Senão, o que restará de ti, nadador?
Nada, nadador.


Mulher proletária


Mulher proletária — única fábrica
que o operário tem, (fabrica filhos)
tu
na tua superprodução de máquina humana
forneces anjos para o Senhor Jesus,
forneces braços para o senhor burguês.
Mulher proletária,
o operário, teu proprietário
há de ver, há de ver:
a tua produção,
a tua superprodução,
ao contrário das máquinas burguesas
salvar o teu proprietário.




O grande desastre aéreo de ontem

Para Cândido Portinari


Vejo sangue no ar, vejo o piloto que levava uma flor para a noiva, abraçado com a hélice. E o violinista em que a morte acentuou a palidez, despenhar-se com sua cabeleira negra e seu estradivárius. Há mãos e pernas de dançarinas arremessadas na explosão. Corpos irreconhecíveis identificados pelo Grande Reconhecedor. Vejo sangue no ar, vejo chuva de sangue caindo nas nuvens batizadas pelo sangue dos poetas mártires. Vejo a nadadora belíssima, no seu último salto de banhista, mais rápida porque vem sem vida. Vejo três meninas caindo rápidas, enfunadas, como se dançassem ainda. E vejo a louca abraçada ao ramalhete de rosas que ela pensou ser o paraquedas, e a prima-dona com a longa cauda de lantejoulas riscando o céu como um cometa. E o sino que ia para uma capela do oeste, vir dobrando finados pelos pobres mortos. Presumo que a moça adormecida na cabine ainda vem dormindo, tão tranqüila e cega! Ó amigos, o paralítico vem com extrema rapidez, vem como uma estrela cadente, vem com as pernas do vento. Chove sangue sobre as nuvens de Deus. E há poetas míopes que pensam que é o arrebol.




13 de novembro de 2009

ALDYR GARCIA SCHLEE - Os limites do impossível



Este é Aldyr Garcia Schlee, escritor nascido em Jaguarão com um pé no Uruguai e residente no Capão do Leão. Mas eu sou do tempo em que o Capão do Leão pertencia a Pelotas e foi lá que tive a sorte de ser sua aluna e tocada pela paixão que o move, que é a paixão pela literatura.

De sua obra tão premiada muito já foi dito e vocês podem encontrar tudo no Google inclusive o texto que escreveu por ocasião da morte de Mario Benedetti, que me fez, como sempre, chorar. Assim como chorei com o prefácio que fez para o meu "pedaço de mim", como chorei tantas vezes lendo os Contos de Sempre, O Dia em que o Papa foi a Melo, Uma terra só. Contos de futebol, Linha divisória.
Que sei eu? Para mim é um escritor raro. E enorme. Sabe-se que está tudo lá: pesquisa, história, política, experiências, tudo cenário para a verdade com que constrói os personagens, que somos eu e você, e mais um sentimento fraterno que tem pelas vidas miúdas, pela capacidade de revelar como o sentimento iguala as pessoas e as transforma em heróis de histórias sem grandeza, mas absolutamente emocionadas e emocionantes. Talvez seja essa emoção, essa capacidade de não se deixar invadir pelo desencanto da maturidade que o faz transformar em criaturas de verdade aquelas que nunca se viram assim.

Não vejo a hora de ler Os limites do impossível. Estou louca para sentir a emoção que é única, que vem do encontro da arte com a nossa própria humanidade, despertada por quem conhece a fundo uma coisa e outra.
Estou louca para chorar e rir sabendo que ele está lá, no Capão do Leão, fazendo planos, contando histórias, com a Marlene, com os filhos, com a neta, que é Helena, com a memória de todas as coisas que vivemos e sonhamos, no Pelotense, na Gazeta, e que são como se fossem hoje, de rir e chorar.

Os limites do impossível - contos gardelianos
A fabulosa e triste história do nascimento de Carlos Gardel em Tacuarembó, Uruguai.

© Aldyr Garcia Schlee
Livro de contos - 204 páginas - 2009
Edições ARdoTEmpo

Aldyr Garcia Schlee é um dos escritores mais importantes do Rio Grande do Sul e do Brasil. Romancista e contista de fôlego, várias vezes premiado, escreve em português e em espanhol, mora bem ao ao sul do País, em local bastante próximo à fronteira com o Uruguai (Capão do Leão) e transformou tudo isso (vivência, cenários originais e diversidade cultural) em rica matéria-prima para sua literatura. É o designer criador do mítico uniforme da seleção brasileira de futebol (1953).

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10 de novembro de 2009

AUGUSTO DOS ANJOS - 12 de novembro




Apagão, temporal e Shimon Peres. Pior impossível, mas as autoridades riem com Madonna e o petróleo. Queixam-se os aposentados com razão, a população está a descoberto e a polícia dá medo. Tempos de Deus me livre. Quem está lendo está vivo, e isso já é alguma coisa.
Brindemos, pois, mesmo assim, com Augusto dos Anjos, um chorão daqueles. E fiquemos no Choro (o ritmo) que esse é bom, e é nosso.
E aliás, uma dica: aos domingos, 8 da matina, Henrique Cazes apresenta O CHORO É NOSSO, na MPBfm, 90.3. Não tem pra mais ninguém. É bom demais. Seleção variada, qualidade garantida e comentários de Henrique Cazes, que sabe tudo e também faz história na nossa música. É como se a gente estivesse numa roda de chorões.


A Esperança


A Esperança não murcha, ela não cansa,
Também como ela não sucumbe a Crença.
Vão-se sonhos nas asas da Descrença,
Voltam sonhos nas asas da Esperança.

Muita gente infeliz assim não pensa;
No entanto o mundo é uma ilusão completa,
E não é a Esperança por sentença
Este laço que ao mundo nos manieta?

Mocidade, portanto, ergue o teu grito,
Sirva-te a Crença de fanal bendito,
Salve-te a glória no futuro - avança!

E eu, que vivo atrelado ao desalento,
Também espero o fim do meu tormento,
Na voz da Morte a me bradar; descansa!


A louca

A Dias Paredes


Quando ela passa: - a veste desgrenhada,
O cabelo revolto em desalinho,
No seu olhar feroz eu adivinho
O mistério da dor que a traz penada.

Moça, tão moça e já desventurada;
Da desdita ferida pelo espinho,
Vai morta em vida assim pelo caminho,
No sudário de mágoa sepultada.

Eu sei a sua história. - Em seu passado
Houve um drama d’amor misterioso
- O segredo d’um peito torturado -

E hoje, para guardar a mágoa oculta,
Canta, soluça - coração saudoso,
Chora, gargalha, a desgraçada estulta.
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4 de novembro de 2009

A CORJA DA UNIBAN


ÀS VEZES ACONTECEM COISAS QUE JÁ PENSAMOS ENTERRADAS. Ilusão! O assédio sofrido pela estudante da Uniban por causa de uma mini-saia (assim mesmo, do jeito que sempre foi) é coisa inimaginável. Tão inimaginável quando revoltante. Quer dizer que os rapazes não conseguem se conter?
Imaginem vocês se as mulheres não conseguissem se conter a cada peito nu, a cada par de pernas encantadoramente masculinas que passeiam por esses trópicos. O que seria?
Mas enquanto eu pensava no quê escrever, alguém o fez antes de mim, e melhor.
Fiquem, portanto, com Daniel Santos, que prova: os idiotas machistas podem ser muitos, mas não se sobrepõem a nenhum homem que saiba, de fato, o que é uma mulher.

A corja da Uniban

* Por Daniel Santos

Há homens que, diante de uma bela mulher, lhe dirigem galanteios. Outros, no entanto, se enfurecem sem poder de abordagem, pois se sentem (e se sabem) insuficientes para o que mais desejam: tê-la em seus braços.

Uns se apressam a confortá-la, se fraqueja, e podem, ao menos por minutos, segurar-lhe a mão. Outros, sem capacidade de estender a mão a qualquer e raivosos da própria impotência, aproveitam para execrá-la.

Diante de uma bela mulher, há homens que perdem o poder de comando, assustam-se com a súbita sujeição e se enfurecem, sem entender aqueles que se abandonam preguiçosos ao toque acetinado das mãos dela.

Muitos acreditam que a sedução consiste em ostentar bíceps: endurecem nos braços a ereção que não se empertiga entre as pernas. Mas muitos se sentem plenamente viris apenas por abrir portas a essa mulher.

Há homens que abrem portas no murro, mas, felizmente, tantos outros já entenderam que, muitas vezes, basta um jeitinho adequado de intrometer a chave e forçar de leve, bem devagar. Só isso. É o suficiente.